domingo, 10 de abril de 2011

O Fim

Depois de um fim-de-semana de congresso, de não sei o quê na Madeira e de saber que os islandeses não querem pagar o champagne que beberam, resolvi aproveitar o resto de domingo e reler O Fim, de António Patrício. Quando há vinte anos li pela primeira vez os livros do autor, que publicou esta peça pouco tempo antes do fim da monarquia constitucional, não consegui perceber este sentimento de apocalipse que sobressai de palavras como estas — "Há oito dia já, não existimos ...; desde que os representantes dos nossos credores, reunidos em conferência internacional o decidiram. Pois bem: o conselho reuniu hoje... Tratou-se de ir, o mais polidamente possível, à despedida dos embaixadores, que receberam ordem dos governos para partir...; calculou-se a hora a que chegarão, para tomar posse de nós, as esquadras estrangeiras...; e alguns dos meus colegas, prevendo um protectorado moderno, no espírito da nossa civilização, dizem constar-lhes: que além da rigorosa administração da fazenda que foi nossa, nada sofreremos... Vão dar-nos mesmo um parlamento. Só não existimos... De resto, um parlamento póstumo ...

domingo, 13 de março de 2011

Frei Bento Domingues escreve no jornal O Público, todos os domingos, crónicas de leitura indispensável e irresistível. Na crónica de hoje, "Virtudes para um mundo melhor", disserta sobre a ética, assunto que em tempos de crise floresce nos discursos. Frei Bento Domingues lembra também que "a ética é tanto mais evocada quanto menos é vivida".
Da crónica retenho estes dois parágrafos que considero de actualidade extrema;
— Somos potencialmente bons e maus nos nossos comportamentos e nas nossas decisões. Somos seres não acabados que precisam de se robustecer no bem para ter energias para resistir ao mal. — [...] para mudar o mundo, não basta o protesto e o desejo. Para participar na mudança, é preciso descobrir e equipar-se com as Virtudes para outro Mundo Possível. Sem elas, tudo ficará na mesma, depois dos êxitos aparentes das grandes manifestações.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

o próximo acto

Imaginem-se sozinhos numa viagem de muitos quilómetros. Há-de chegar aquela altura em que ligam o rádio, para não se sentirem desactualizados, e de repente ouvem alguém dizer que não se lembra se preencheu ou não uma ficha da PIDE.
Se a Pide é a que eu estou a pensar, das duas uma: ou a pessoa se inscreve e passados uns anos já não se lembra porque ficou desmemoriada e, nesse caso, não se deve levar a mal. Eu, que sou eu, às vez também me esqueço do sítio onde guardo as coisas. No outro dia cruzei-me com o meu filho e não lhe falei. O que é que querem? Ia distraída, a pensar na vida.
Ou a Pide é aquela polícia chata de pessoas que ganhavam mal e faziam queixa do vizinho porque eram vingativas e não só.... Se é dessa que estavam a falar é estranho dar ares de que aquilo foi coisa de somenos. A PIDE era uma polícia bera e há valores de integridade que não devem ser esquecidos.
Nenhum familiar meu foi abarbatado pelos pides e a experiência mais próxima que tive foi quando, numa manhã de inverno, se constou que tinham levado o pai da Vitorinha. Eu, que tinha oito anos, a partir daquele episódio passei a olhar a rapariga como alguém muito vulnerável às intempéries da vida.

PS:
Esclareço que se estão a fabular o que leram será apenas por devaneio da vossa imaginação.
Esclareço também, apenas por desfastio, que ainda não decidi em quem vou votar e o mais provável é deixar o boletim em branco para os candidatos preencherem depois. Será uma pequena lembrança de Natal.


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

esta crise que nos molesta

Se Ricardo Araújo Pereira nos viesse dizer que os tempos estão difícies, mas mesmo assim não será isto o fim dos tempos, seria simpático. Mas será que o seguiríamos como os americanos fizeram com Jon Stewart?

Será que isto não é o fim do mundo, mas o fim dos políticos?

Será que a sociedade é já de tal modo perfeita que já não se justifica a existência de políticos e que nos chega o conforto dos cómicos para fazermos o que o poder económico espera que façamos?

sábado, 30 de outubro de 2010

Esta crise que nos molesta

Da primeira visita do FMI não tenho grande lembrança, a não ser o rombo que as restrições às importações vieram causar na minha colecção de polos Lacoste, pullovers coloridos e calças de ganga americanas.

Eu sonhava, naquele tempo, com uma sociedade justa em que andariamos todos de uniforme de caqui e gola à Mao, assim sendo, o FMI até que poderia servir para acelerar o processo.

Da segunda visita lembro-me, se bem que não consiga precisar o dia em que Teresa Ter-Minassian aterrou em Portugal. Não tenho grandes queixas, ainda para mais sendo eu uma pobre funcionária pública não me contemplaram com o famoso Certificado de Aforro (para aí da classe A), que a esta hora já valeria 5 ou 6 vezes mais. Não senhor, recebi na tesouraria o dinheirinho e gastei-o em coisas que certamente agradaram ao meu gosto de escriturária-dactilografa.

Para a próxima vou estar de olho nos Kamones que hão-de vir para ver o que vai acontecer. Não ao meu pecúlio, nem ao meu pré, mas à tentativa de tornar este país habitável.


sexta-feira, 22 de outubro de 2010

e-migrar

Deveria ter emigrado, mas não o fiz. Não foi preciso. Achei que poderia interromper os estudos, começar a trabalhar e depois logo estudaria, porque o que era urgente era tornar-me independente. Mas não, aos 22 anos tornei-me funcionária pública, uma coisa que hoje está ao mesmo nível que ser cigano em França ou judeu na Polónia, no tempo da guerra.

Nos idos de oitenta ser funcionário público não era nada, pois estavam ainda muito presentes os tempos em que eramos poucos e mal pagos. Nos idos de noventa começámos a ser mais, mas ainda mal pagos. A sociedade já se dava conta da nossa existência e olhava para nós como cretinos inábeis incapazes de ganhar o “bom” dinheiro que se ganhava no privado saltando de sucesso em sucesso.

Agora desde 2000 somos os palhaços da festa, custamos dinheiro, somos muitos (de quem será a culpa?) e querem o nosso lugar.

É lamentável que quem nos governa e quem nos quer governar não consiga ultrapassar a sua incompetência a não ser culpando uma ou outra classe. Mas tal como eu sei, eles também sabem, que um grupo é apenas a ponta do iceberg.

Os jornalistas e os políticos não param de incutir ódio sobre nós, mas não serve de muito porque nós pagamos impostos como toda a gente (e eu pago há trinta anos, e se me deixarem pagarei mais 18 anos, com muito gosto), e não é possível, digo eu a não ser que nos enviem para um arquipélago de “goulash”, pois, como qualquer trabalhador, nós se formos despedidos mereceremos indemnizações, subsísdios de desemprego, whatever, ou não? Era mais fácil, mas a vida é como é, e nem sempre é fácil.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

boas notícias

"O homem sem rosto" como era conhecido. Sentava-se dias a fio num poial no Rossio. Assustador para alguns, sobretudo para as crianças que ficavam sem palavras quando o viam, como aconteceu ao meu filho e ao amigo que o viram ali sentado numa noite de verão. Bondoso, como eu o vi uma vez e sem poder resistir às lágrimas, levantando-se para ir entregar um pedaço de pão ao homem que esgravatava no caixote do lixo.
Foi operado nos Estados Unidos, está feliz e oxalá tudo lhe corra bem daqui para a frente.